Não nego que as suas histórias encantam-me, que o traço seduz-me.
Há alguns anos era entusiasticamente celebrado por conhecidos e alguns amigos com quem experimentei a vida boémia e displicente da noite do Bairro Alto.
Confesso que nunca me senti parte daquele todo de sombras e luz, pretensões intelectuais e radicalidade abstracta. Para além de jogar o jogo favorito de todos os que conhecia, conheci e conheço – dizer mal – sempre tive como fito fazer algo que fugisse a isso.
Dai que o sistemático cepticismo não casa comigo.
Ainda hoje – quando os cabelos grisalho que vão despontando me aconselhariam à moderação e pacatez “das pantufas e da lareira” ou pelo menos ao realismo cómodo do “aceitar as coisas como elas são” – continuo a ser visto com um misto de “compaixão” pelos meus iguais que “se abriram ao mundo e tentam ganhar um lugar ao sol do quotidiano” e de incredulidade por parte dos jovens que depois de mim foram sendo formados na “inevitabilidade das coisas”.
E por isso mesmo começo só agora a entender como o Corto Maltês é tão celebrado por tanto céptico pós-moderno. Romântico, meio mercenário, enfim, amigo dos amigos, céptico e aventureiro, numa palavra individualista.
Mas cá sigo eu, convicto ainda de que são as pessoas concretas em acção colectiva que podem mudar as coisas, que nessa acção se podem e devem desenvolver fortes laços de cumplicidade e amizade. Numa palavra – que alguns dirão palavrão –, ainda me atrevo a dizer que sou colectivista.